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Entrevistas

Nossa primeira professora

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Idalina de Andrade Leone tinha 98 ano quando foi entrevistada para a revista NOSSA. Faleceu cerca de dois anos depois da entrevista.

TEXTO E FOTO – Rodrigo Guadagnim

NOTA DA REDAÇÃO: A matéria foi publicada originalmente na edição número 2 da Revista Nossa (setembro de 2011) e integra reportagem especial em homenagem aos 100 anos da Escola Estadual Barão de Serra Negra. Idalina faleceu cerca de dois anos depois de a revista ser publicada. 

Embora resida em São Paulo desde a década de 1960, o  nome da quase centenária professora Idalina de Andrade Leone, 98 anos, permanece na memória de vários rio-pedrenses. Na Escola Barão de Serra Negra, ela dedicou quase três décadas de sua vida ao magistério. A primeira genuinamente rio-pedrense guarda boas histórias de um período em que a cidade era referência em educação a partir da soma de esforços dos professores, funcionários, pais e estudantes. Permanecem em sua memória nomes de ex-alunos e de colegas de trabalho.

A senhora foi professora do grupo escolar por quantos anos?

Minha primeira nomeação foi para São Pedro, onde fiquei até 1932. Depois fui transferida para Rio das Pedras para a fazenda do Lara Campos. Prestei outro concurso e, então, fui removida para o grupo escolar (Barão de Serra Negra), onde fiquei até me aposentar. Ao todo, fui professora em Rio das Pedras por quase 30 anos.

A senhora é nascida em  Rio das Pedras mesmo?

Sim. Sou filha de mãe brasileira, de ascendência italiana, e de pai português. Nascida em Rio das Pedras, em 1913.

O pai era nascido em Portugal?

Papai ao chegar ao Brasil trabalhou na estrada de ferro Sorocabana, em Rio das Pedras, carregando toras de madeira no local conhecido antigamente como “Viga”.

 

Idalina fica capa da edição número 2. Depois que a revista foi publicada, ela e a família agradeceram, por e-mail. Segue o conteúdo: “Ficamos muito contentes com o número da revista. É para guardar com muito cuidado e reler de vez em quando. A repercussão foi muito, muito grande, recebi inclusive telefonema de uma ex-aluna da primeira escola em que lecionei em Rio das Pedras, na fazenda do Banco, dos Lara Campos. Muito obrigado. Sabemos quanto é difícil fazer esse trabalho em uma cidade pequena. Esperamos que consiga ir muito mais longe nessa sua tarefa”. Idalina de Andrade Leone e família.

 

Então o pai da senhora veio para Rio das Pedras para trabalhar na estrada de ferro?

Não, ele veio para Rio das Pedras porque já tinha um irmão na cidade, o José Maria de Andrade, que é avô da Ivete. O nome do meu pai era Manuel Maria de Andrade, ele chegou ao Brasil com uns vinte e poucos anos.

Veio direto de Portugal para Rio das Pedras?

Sim, direto. Nessa ocasião, minha mãe já era viúva, mas muito moça ainda, com uns vinte e poucos anos. Seu primeiro marido se chamava Manuel Domingos Rossa. Depois, meu pai se casou com ela. Por isso tive irmãos com sobrenome Rossa e outros Andrade, como eu.

Com o que trabalhavam?

Após esse começo trabalhando com madeiras, montou um pequeno armazém de secos e molhados quando se casou com mamãe. Tiveram esse armazém por muito tempo, na Rua Torta. Depois mudamos para um sobrado. Ficamos lá por muitos anos. Mamãe faleceu e papai ficou morando comigo. Trinta e oito anos comigo! Eu já casada com Abílio Leone.

Quando veio para São Paulo?

Só depois que os meus dois filhos já tinham a profissão escolhida e sem possibilidades de continuar os estudos em Piracicaba. Um queria ser arquiteto, o outro ainda estava decidindo e eu já estava aposentada nessa ocasião, então resolvi vir para São Paulo, porque não queria deixar os meus dois filhos na casa dos outros. Foi por isso que saí de Rio das Pedras. Caso contrário, não teria saído.

A senhora gostava da cidade…

Eu nasci lá, fui criada lá com os meus irmãos. E como professora, eu fui muito estimada em Rio das Pedras. Isso eu posso falar de boca cheia (risos). Os alunos que eu encontro hoje em dia me abraçam e dizem que eu era brava, daí eu olho para eles meio feio e eles logo dizem: “mas que nós aprendemos, aprendemos…”.

Ainda vai para Rio das Pedras? 

Estive lá faz pouco tempo. Fui com a Wanda, sogra do meu filho, nascida em Indaiatuba mas casada com um rio-pedrense, José Romildo Limongi. Fomos visitar a cunhada dela, Adelina Limongi. Estou sempre pensando em ir para lá, mas na minha idade tudo é mais penoso.

Não é mais a mesma cidade. Ainda consegue sentir aquele encanto de antigamente?

Houve muito progresso, nem todos positivos. Aquela amizade de antigamente não tem mais, tanto é que no nosso tempo não se fechava nem a porta da casa, porque não havia violência. Meu pai se dava muito bem com os rapazes que desciam da Sociedade Italiana, que atualmente é a Sociedade Cultural Riopedrense. Nós morávamos ao lado da igreja, pouco abaixo do Barão. Esses moços desciam e viam meu pai sentadinho na porta de casa (refere-se ao imóvel em que hoje funciona a ótica Matriz). Eles gostavam tanto dele que chegavam e diziam: “Vamos tomar uma no Bar do Raimundo”, que era o bar do Raimundo Jorge (onde funciona uma agência bancária, em frente à igreja).

A senhora deu aula para muita gente que depois seguiu no magistério?

Muitas delas seguiram carreira de professora, tanto é que nesse tempo os fazendeiros não queriam que as mulheres fossem estudar para professora porque tinham que ir para Piracicaba. Eles achavam que era feio um fazendeiro mandar alguém estudar para ser professor, mas uma delas, que foi colega minha, a Luisa Jorge, quis estudar no colégio das freiras de Piracicaba. Esse colégio se tornou aclamado por causa da qualidade da educação.

Quando a senhora começou a dar aulas na Escola Barão de Serra Negra?

Fui para o Barão por meio de um concurso em 1933. Comecei a dar aulas e fiquei até Aposentar, pouco antes de 1961. Depois disso, vim para São Paulo.

A senhora foi a primeira professora natural de Rio das Pedras?

Sim, fui a primeira rio-pedrense a dar aulas na cidade.

Dentro do Barão, como era o método de ensino?

Uma maravilha, tanto é que a professora que não alcançasse uma aprovação acima de 75% se sentia envergonhada. Os professores que gostavam de alfabetizar sempre eram colocados pelo diretor nas mesmas salas que davam aula no ano anterior, pois as crianças saíam alfabetizadas. Eu acho que a boa alfabetização é a base para qualquer profissão escolhida pela criança.

Na sua época, a senhora trabalhava com um diário. Atualmente as crianças vão às aulas carregadas de material escolar…

Eu não sei o porquê de tanto material. Naquela época, eles saíam tão bem alfabetizados com o lápis de cor e o lápis preto, o lanche e depois o livrinho que eles recebiam. Tanto é que naquele tempo, no dia em que se entregava o livro de leitura para as crianças, era uma festa. Era festejado isso. Hoje não temos nada disso.

Caderno com o roteiro para as aulas que alfabetizaram gerações de rio-pedrenses era guardado com carinho pela professora

Quem enviava esse livro?

Esse livrinho era um presente para criança e também para os pais que viam suas crianças se alfabetizando completamente. Vinha no final da primeira série.

Nosso grupo escolar sempre foi o primeiro da Delegacia Regional de Piracicaba. Prova disso é que sempre que as crianças iam fazer exames em outras cidades da região ou mesmo em Piracicaba as pessoas diziam: “É do grupo escolar de Rio das Pedras? Então ele passa”. Falavam assim.

Qual o maior orgulho, a maior recompensa que a senhora recebeu por ter dado aula tantos anos?

A minha recompensa é quando encontro ex-alunos. Eles me abraçam e dizem “eu devo à senhora muito do que sou hoje”.

A senhora tem boas lembranças dos ex-alunos?

Tem uma ex-aluna que foi alfabetizada por mim em São Pedro, a dona Virgínia Pratta. Mais de 40 anos depois, recebo um convite para o lançamento de seu primeiro livro em Piracicaba. Ela já era viúva com seis filhas formadas e se lembrou de mim, sua professora. Fui homenageada por ela no Clube Coronel Barbosa, em Piracicaba. Ela subiu no palco e disse: “um minuto de atenção, meus queridos. Vou chamar ao palco a minha primeira professora”. Quando me levantei, fui recebida com uma salva de palmas e subi ao palco. Lá no palco, ela me entregou uma placa com os dizeres: “À minha querida professora, dona Idalina de Andrade Leone, a quem eu devo a minha personalidade”. Homenagem bonita como essa não são todos os professores que recebem.

Antes de começarmos a entrevista, a senhora comentava de um aluno que foi expulso da escola. Pode contar com mais detalhes?

O Tonico. Ele foi alfabetizado com dificuldade porque era muito levado. Depois, teve aulas com outras professoras. Entretanto, quando teve aulas comigo, graças a Deus consegui alfabetizá-lo.

Anos mais tarde vocês se reencontraram?

Depois que fui para São Paulo, voltava periodicamente a Rio das Pedras para fazer visitas, principalmente a casa do Antenor e Albina Cortellazzi, porque éramos muito amigos. Em uma dessas voltas, a Lurdinha Cortellazzi me chamou dizendo que tinha alguém à minha espera. Ao entrar na cozinha me deparo com o Tonico, que me deu um abraço e um beijo tão carinhoso e disse na frente de todos ali: “Devo o meu emprego à senhora, que me alfabetizou”. Essa alegria não é qualquer pessoa que pode ter.

Os professores davam aula para uma turma do 1º até o 4º ano?

Em alguns casos, havia professores que gostavam de seguir com uma mesma turma até o final. Houve uma ocasião em que o diretor queria que nós seguíssemos com uma mesma turma até o final, então dependia muito.

A senhora tinha fama de ser mais brava…

Os pais ajudavam os professores, tanto é que um aluno nessa época, quando era repreendido na escola, não contava para os pais por medo de ser repreendido também em casa. Hoje em dia os pais acobertam os erros dos filhos. Eu posso ter sido brava, mas eles aprendiam comigo.

Na verdade a senhora era exigente.

Sim, eu era exigente porque senão não aprendiam nada. Alfabetizar os alunos não é brincadeira, não. Era por causa disso a minha fama de brava. Eu era exigente com eles.

Nesse tempo, havia o hábito de ajoelhar no milho e receber palmatória?

Não, na minha época não tinha mais isso. Esse tipo de castigo não ajudava.

O sistema funcionava porque os pais ajudavam os professores. Era isso que fazia a diferença. O professor era querido pelos alunos.

A senhora se sentia uma pessoa importante por ser professora?

Sim, porque quase todas as crianças que eu alfabetizei seguiram uma profissão. Eu me lembro de ter alfabetizado pessoas como o Dirceu Cortelazzi, o Denizar Guidolim…

Você teve algum aluno que chegou a ser prefeito em Rio das Pedras?

Não, mas o meu marido quase foi prefeito indicado pelo povo se não tivesse falecido. Morreu muito cedo, com 33 anos. Somente fiquei casada com ele durante oito anos e nunca me casei de novo.

Como era o sistema político naquela época?

Um dos últimos prefeitos antes dele morrer foi o Caetano Oscar Waldemar Gramani, e foi um bom prefeito, mas atrapalhou um pouco a nossa banda. Então, o Antenor Cortelazzi e o Aureliano Antonelli ficaram muito chateados. Eu escrevi um artigo no Jornal de Piracicaba, porque Rio das Pedras não tinha jornais naquela época, pedindo que não deixassem a banda morrer e nem o samba acabar (risos). Graças a Deus, a banda continua hoje em dia!

A senhora menciona as pessoas que passaram pelos grupos escolares em que lecionou e que foram bem-sucedidas. Ou seja, ajudou a construir uma sociedade melhor por meio dessas pessoas. A vida lhe retribui esse favor?

Foi generosa, graças a Deus, porque tudo depende de você. Destino nós não temos porque quem faz a vida na Terra somos nós. Olha, eu fiquei viúva muito cedo, meus filhos ainda estudavam, era professora e ainda não tinha recebido nada pelo falecimento do meu marido, que era funcionário do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Somente anos depois eu comecei a receber do IBGE. Mas criei meus dois filhos com o salário de professora, eles estudaram no Sud Menucci de Piracicaba e depois de me aposentar vim para São Paulo por causa da profissão deles. Caso contrário, não teria deixado Rio das Pedras.

 

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30 ANOS ENSINANDO A PENSAR

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Nesta entrevista, Vanderci Marrano conta, entre outras coisas, como o convite de uma tia para passar um ano nos Estados Unidos mudou a vida dela. FOTO: Thiago Altafini/Nossa Rio das Pedras

 

Há três décadas militando no ensino do inglês, a professora Vanderci Marrano conta com bagagem consistente e mentalidade moderna para ensinar uma geração cada vez mais interessada no idioma.

Rodrigo Guadagnim
rodrigo@nossariodaspedras.com.br

Evoluções tecnológicas importantes transformaram radicalmente a sociedade nas últimas três décadas. No que diz respeito ao ensino de idiomas, as mudanças foram benéficas. A avaliação é de Vanderci Marrano, professora de inglês desde 1990 e que há 28 anos fundou a primeira escola de idiomas de Rio das Pedras, o Centro de Idiomas English VM.

A maior facilidade para acessar informações de qualquer parte do mundo, o contato com jogos eletrônicos estrangeiros, a interação interpessoal universalizada pelas redes sociais, entre outras inovações possibilitadas pela Internet, estimularam em crianças, adolescentes e adultos o interesse pelo aprendizado do inglês. Atualmente, conta Vanderci, a maior parte dos alunos procura a escola por interesse próprio e não obrigada pelos pais. No início do English VM, era o contrário.
Na entrevista a seguir, Vanderci narra detalhes da história da escola, fala sobre como as mudanças culturais ocorridas desde a fundação do English VM alteraram os perfis dos alunos e conta como o convite de uma tia para passar um ano nos Estados Unidos mudou a vida dela e trouxe benefício a muitos moradores de Rio das Pedras, que tiveram – e continuam tendo – a oportunidade de aprender inglês em nível de excelência sem sair da cidade, em uma escola que não para de investir para oferecer conforto e novas tecnologias.

NOSSA RIO DAS PEDRAS – Como foi o início do VM?
VANDERCI MARRANO – Começamos pequenos, em fevereiro de 1992, no barracão em que funcionava o antigo Choppão [entre a sorveteria Central e o Primos Som]. Ficamos um ano ali. O espaço ficou pequeno. Mudamos para uma residência na Rua Brasil. De lá, viemos para este imóvel [na rua Dr. João Tobias, 77, Centro], onde permanecemos desde 1994. O espaço foi totalmente adequado para receber uma escola e estamos sempre investindo em tecnologia e em melhorias do espaço físico.

NOSSA – Qual a sua história com o idioma inglês?
VANDERCI – Na verdade, eu não gostava de inglês na escola [risos]. Pensava: por que é que eu vou aprender esta língua se nunca vou usar? Era esta a mentalidade. Mudou bastante, mas ainda tem gente que pensa assim. Até que meus tios me convidaram para ir morar com eles nos Estados Unidos. Fiquei um ano. Tinha 20 anos na época. Fiz curso de idiomas em uma universidade de lá. Passava o dia inteiro em uma universidade estudando. Comecei a gostar porque comecei a falar, comecei a entender. Quando voltei, fui lecionar em Piracicaba.

NOSSA – Faz 30 anos que se dedica ao idioma. Fez muitos cursos no exterior?
VANDERCI – Nos primeiros anos em que levei o pessoal [alunos da escola] para intercâmbios no exterior, eu também fiz o curso. O intercâmbio é outro diferencial da VM. Não tem outra escola em que o diretor leva os alunos e os acompanha no intercâmbio. Vou junto com eles justamente para que eles possam aproveitar ao máximo.
NOSSA – A maior parte das vezes, o intercâmbio da VM foi para o Canadá. Por quê?
VANDERCI – Sim. A maior parte para o Canadá, mas também já fomos para os Estados Unidos, para a Inglaterra. Para o Canadá é mais viável, porque a burocracia é um pouco menor. É mais fácil conseguir o visto. Temos experiência na retirada do visto e uma empresa contratada só para isso. Agora, quem tem visto americano não precisa nem mais pegar o canadense. E também o valor do dólar canadense é mais próximo ao do real.

Vanderci vê os alunos de hoje mais interessados, em razão das inovações globalizadas ocorridas depois da popularização do acesso à internet. FOTO: Thiago Altafini/Nossa Rio das Pedras

NOSSA – Houve avanços tecnológicos tremendos nas últimas três décadas. Sente que mudou a maneira de ensinar e de aprender nesse período?
VANDERCI – Atualmente, é mais fácil porque os alunos estão mais interessados. Eles querem falar. Os adolescentes querem falar, querem aprender. Adoro dar aula para adolescentes. Deixo que eles falem sobre a vida deles. Esse é um diferencial nosso. Saiu um pouco do contexto do livro? Ok, não tem problema. O importante é que estão falando inglês. Eles trazem muito conhecimento para a aula.
NOSSA – Houve mudanças na maneira de pensar?
VANDERCI – Antigamente, os pais é que mandavam os alunos para a escola. Eles nem queriam. Hoje não. Sempre pergunto para eles: vocês estão aqui porque querem aprender ou porque o papai mandou? A maior parte responde que está porque quer. ‘Quero aprender porque quero jogar, quero assistir a filmes…’ Eles querem!

NOSSA – Os resultados são melhores atualmente?
VANDERCI –
Com certeza. O próprio adulto tem melhores resultados hoje. Atualmente, os alunos vêm com vocabulário rico por causa da Internet, por causa de jogos. O papel da escola é ensinar a estrutura gramatical para que possam se virar depois. O inglês não é decoreba. O desafio é ensinar os alunos a pensar.
CONTATO:         

ENGLISH VM
Endereço:
R. Dr. João Tobias, 77 – Rio das Pedras – SP
Telefones:
(19) 3493-1157 (19) 98231-0011
E-mail: 
vm@englishvm.com.br

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YES, SHE CAN

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Beatriz Lopes saiu da escola pública, fez Esalq e conseguiu estágio nos EUA.

É fato que a degradação do ensino público é forma perversa de acentuar a desigualdade social no Brasil. É preciso, entretanto, mostrar que é possível. A rio-pedrense Beatriz Lopes é exemplo desse tipo de superação. Ela concluiu este ano o curso de Biologia na Esalq/USP, uma das mais prestigiadas universidades brasileiras. Nos meses de julho e agosto, ela esteve nos Estados Unidos para um estágio de pesquisa, com dois meses de duração, no Smithsonian Conservation Biology Institute (SCBI), localizado em Front Royal, Virginia.

O estágio no exterior foi custeado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), que aprovou o projeto dela na modalidade Bolsa de Estágio e Pesquisa no Exterior (Bepe).

Beatriz estudou sempre em escolas públicas. Fez o Jardim de Infância na escola Bruna Maniassi Zeppelini. O Fundamental I na escola Barão de Serra Negra, e o Fundamental II na escola Contador Waldomiro Domingos Justolim (popular Escola do Comércio). O Ensino Médio cursou em Piracicaba, na Etec Cel. Fernando Febeliano da Costa (Industrial).

 

NOSSA – O ensino público (infantil, fundamental e médio) vem perdendo qualidade nos últimos tempos e os estudantes de escolas públicas muitas vezes têm a autoestima baixa em razão da crença de que não poderão acessar o ensino superior de qualidade ou que estão menos preparados para competir na vida que aqueles que cursaram escolas particulares. Qual conselho deixa para que os alunos superem este sentimento?

BEATRIZ LOPES – Os alunos de ensino público, em média, têm algumas desvantagens em relação aos de escola particular. Os alunos de escolas particulares muitas vezes possuem vivências mais ricas proporcionadas por aulas em laboratórios, excursões e até mesmo experiências extras na vida escolar, como cursos de inglês e aulas particulares. Nas escolas públicas a diferença social dos alunos é bastante acentuada e nem todos têm essas oportunidades. Além disso, o professor se sente sobrecarregado e não dispõe dos mesmos recursos para ministrar aulas de qualidade comparável.

Contudo, quando se tem um foco e um objetivo essas diferenças podem ser superadas. Existem opções de escolas públicas de qualidade, como as ETECs, e também os cursinhos municipais. Os pais têm importante papel na educação dos filhos, devendo ser a principal fonte de incentivo para os estudos desde o ensino infantil; preciso que se crie o hábito de estudar. Para os alunos que vão prestar o vestibular em breve o conselho é manter o foco e estudar. Para quem tem condições possível procurar opções de cursinhos públicos e particulares de preços variados. Existem também vídeos aula de qualidade na internet sobre todas as matérias. O esforço é grande, mas a recompensa é satisfatória.

 

N – O que exatamente você foi pesquisar nos Estados Unidos?

BL – Fui pesquisar as mudanças nos padrões de movimento de capivaras em paisagens naturais do Pantanal e em paisagens modificadas pelo homem no Estado de São Paulo. Minha pesquisa está inserida dentro de um projeto multidisciplinar de pesquisa sobre as relações entre capivaras, carrapatos e febre maculosa, envolvendo vários pesquisadores e instituições. Especificamente, minha pesquisa conta com o monitoramento de capivaras por Rádio Colar GPS em oito cidades do Estado de São Paulo e outras duas no Bioma Pantanal. Dentre as áreas de São Paulo há ainda uma subdivisão em áreas endêmicas e não endêmicas para Febre Maculosa. Meu objetivo foi detectar diferenças entre a movimentação das capivaras, como por exemplo a área de vida e a distância de deslocamento, nas diferentes paisagens. A associação dos meus resultados com os resultados obtidos por outros projetos do mesmo tema ajudará no entendimento da dinâmica da febre maculosa brasileira, uma das doenças mais letais do Sudeste do Brasil.

 

N – Quais aspectos positivos, quais diferenciais, observou na instituição de pesquisa norte-americana que poderiam ser replicados no Brasil?

BL – O Smithsonian Institute é o maior complexo de pesquisa e museus do mundo. Sem dúvidas o que mais me impressionou foi a disponibilidade de recursos da instituição. Todos os equipamentos são altamente tecnológicos e a pesquisa é de alto padrão.  Já no Brasil o cenário da pesquisa é um dos piores nos últimos anos, com grandes cortes orçamentários e baixo investimento. Além disso, nos Estados Unidos a sociedade parece bastante interessada na ciência. Frequentemente, o instituto recebia visitas de pessoas interessadas em doar seu dinheiro em prol das pesquisas e havia várias atividades para as pessoas conhecerem o instituto como, por exemplo, um acampamento para as crianças. Enquanto isso, no Brasil, a Universidade ainda parece distante da sociedade e de modo geral as pessoas não levam a sério a profissão do pesquisador dizendo que estudo não é trabalho e não reconhecendo os benefícios da pesquisa para o desenvolvimento do país.

 

N – Por que a opção pela biologia?

BL – Desde criança eu gosto muito da natureza, dos animais, plantas e as paisagens em que estão, sempre estive preocupada com as condições ambientais do planeta. Na biologia encontrei a oportunidade de estudar e trabalhar com algo que eu gosto e considero de muita importância para a sociedade como um todo. O curso de ciências biológicas me permitiu uma consciência ambiental ainda mais consistente, e hoje eu posso ser veículo de mudanças de comportamento e opiniões para as pessoas que me cercam.

N – Quais seus planos para o futuro? Pretende seguir carreira acadêmica ou ingressar no mercado?

BL – Para o futuro mais próximo pretendo seguir a carreira acadêmica, ingressando no mestrado e doutorado, na mesma área de pesquisa que atuo. A partir disso, ainda não tenho definido se continuarei na carreira acadêmica ou não. Ambas as carreiras possuem o ônus e o bônus, quero experimentar a acadêmica em busca da realização profissional, mas não levo como única opção.

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Uma vida de dedicação à música clássica

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“Hoje sei que o que me moveu a escolher violoncelo foi o som do instrumento, grave e sério, poucos acham que eu sou assim, mas no fundo é a minha essência, um prolongamento do meu ser. Na verdade, a maneira mais sincera que eu consigo me expressar” Crédito: Nilo Belotto/Jornal de Piracicaba

Entrevista concedida ao jornalista Rodrigo Alves e publicada na edição número 5 da Revista Nossa (janeiro de 2014)

 

A música clássica é uma extensão da vida de André Micheletti. Nascido em Piracicaba e criado em Rio das Pedras, o instrumentista até pensou em seguir carreira na medicina. A paixão pelo violoncelo falou mais alto. Depois da faculdade em Campinas, ele seguiu para os Estados Unidos. Em Chicago fez o mestrado e, em Indiana, cursou o doutorado.

A vida no exterior não foi fácil, mas com o apoio da esposa Mayumi, não desistiu dos sonhos. Levou consigo o aprendizado nos primeiros anos de vida, proporcionado pelos pais Tarciso e Catarina, além do avô materno, Guido Giovanini, que tocava violão. Hoje, sua rotina é apertada: é violoncelista de uma das orquestras mais respeitadas no país, a Bachiana Sesi Filarmônica, regida pelo maestro e pianista João Carlos Martins. Dedica-se à docência, por acreditar na democratização da música erudita. Está à frente da coordenação pedagógica do Instituto Fukuda, na capital, e do Feimep (Festival Internacional de Música Erudita de Piracicaba), cuja proposta é proporcionar o desenvolvimento pessoal e profissional de novos músicos. Ainda em sua terra natal, assumiu em 2013 a regência da Orquestra Sinfônica de Piracicaba, depois da morte do maestro Egildo Rizzi, seu ex-professor. Atualmente com residência fixa em São Paulo, dá aulas na Escola Municipal de Música de São Paulo, no Instituto Baccarelli, sediado na comunidade de Heliópolis, e em duas faculdades. Pai de Jun, sente um orgulho danado ao ver que o garoto de 11 anos possui a mesma determinação para os estudos musicais. Sem esquecer das raízes, André cita as aulas de teatro na Escola Macone e no Cedac (Centro de Ação Comunitária). Nesta entrevista à Revista Nossa, André também se mostra grato aos amigos rio-pedrenses, que cultiva desde a infância.

Quem mora em Rio das Pedras o considera rio-pedrense. Mas quem é de Piracicaba, lhe classifica como piracicabano. Digamos que você é cidadão das duas terras. Mas, de fato, onde nasceu?              
Sou piracicabano, nasci na Santa Casa de Piracicaba. Na minha infância senti-me mais rio-pedrense, pois meus pais mudaram para Rio das Pedras quando minha irmã Angélica e eu éramos bem pequenos. Porém, aos 14 anos, quando mudei de colégio e passei a estudar em Pira, minha vida toda ficou focada lá, na Empem (Escola de Música de Piracicaba Maestro Ernst Mahle) e no Colégio Dom Bosco. Só dormia mesmo em Rio das Pedras. Hoje, depois de tanto tempo, realmente me sinto piracicabano, mas tenho Rio das Pedras no meu coração e divido parte de minhas férias entre as duas cidades.

Você estudou na escola pública de Rio das Pedras? Até qual série?     
Estudei no Macone (Escola Estadual Professor Manoel da Costa Neves) até o início da sétima série. Eu amava lá… Lá eu me apaixonei pela primeira vez, foi muito marcante. Sou eternamente grato aos que me orientaram durante este período, que foi crucial para a formação de caráter. O respeito que tínhamos pelos nossos professores, e vice-versa, era muito grande. Mesmo rotinas que pareciam esdrúxulas, mostram-me hoje importantes, como o culto à bandeira às sextas-feiras. Sou grato aos meus colegas, à diversidade que tínhamos e a não distinção de classe e cor.

Os irmãos Cláudio e André nas extremidades em apresentação em Piracicaba. Crédito: Rodrigo Alves

Do que se recorda desse período (amigos, professores, passagens marcantes) da infância e da adolescência em Rio das Pedras?

Olha, eu sempre fui antissocial. Minha infância em Rio das Pedras foi, em parte, a época de descobrir a ler e a estudar. Meus amigos eram o Pablo Ganassim (ele mora a quatro quarteirões do meu apartamento aqui em São Paulo e esteve com a esposa e o casal de filhos em minha casa na semana passada), o Fábio Rabelo, meu primo Allan Giovanini, Rosiane De Gaspari, Flávia Gaioto, Djalma, Fernanda, tantos outros… Não posso esquecer que, sempre que pude, voltei para cortar cabelo com o Arlindo ou a Cláudia, que também estudou  comigo. Professores marcantes: dona Cida e meu tio Guidinho, o Lino Guido Giovanini, adoro matemática até hoje! O seo Walter Vallerini, professor de educação física e que treinava o time de handball da cidade. Como eu gostava e como posso garantir que foi importantíssimo para meu desenvolvimento pessoal. Não posso esquecer que adorava teatro, seja declamar no colégio ou os teatrinhos no centro espírita (Cedac). Ainda hoje, agradeço as oportunidades no palco para declamar no Macone, ou ao teatro do Cedac e ao handball, que aprendi a adorar com o seo Walter. Essas três coisas que parecem ser irrelevantes, foram de suma importância para mim. Sem elas acho que eu não teria capacidade e estrutura de enfrentar o palco hoje em dia. Sou muito grato a essas oportunidades que me foram dadas. Cultura e esporte são essenciais na formação do ser humano.

Com qual frequência retorna para visitar os pais em Rio das Pedras?

A vida é corrida. Esta semana, por exemplo, já viajamos bastante. Cheguei esta manhã do Rio de Janeiro, semana que vem vou pra Ribeirão Preto, na semana passada estive três dias em Campinas. Tudo isso conciliando minhas atividades em São Paulo, então, o tempo que me sobra e posso ir para Pira e Rio das Pedras, eu vou.

Quais foram as amizades preservadas, entre idas e vindas?

Pablo Ganassim, Allan Giovanini e falei algumas vezes, mas não consegui encontrar ainda, a Rosiane De Gaspari.

Os irmãos Cláudio e André com os pais Tarciso Micheletti e Catarina Giovanninni Micheletti´. Crédito: Rodrigo Alves

Seus outros irmãos, Angélica, Cláudio e Mariela, também se dedicam profissionalmente à música. De quem veio e como foi esse incentivo na família?

Meus pais, por influência de meu avô materno, Guido Giovanini, que tocava violão. Foi do interesse pela música da família Giovanini que conheci o maestro Rizzi, então amigo da família. Ele foi meu professor de harmonia e contraponto. É por conta dele que hoje dedico parte de minha carreira à Orquestra Sinfônica de Piracicaba. No dia 23 de dezembro, estaremos três de nós tocando juntos no Teatro Municipal Erotides de Campos, em Piracicaba. Cláudio e eu faremos o concerto duplo de J. Brahms e a Mariela tocará na orquestra. A Angélica não tocará, pois não há piano neste tipo de programa. Como você escolheu o violoncelo? Eu ficava olhando a sala dos cellos e achava o máximo. Hoje sei que o que me moveu a escolher violoncelo foi o som do instrumento, grave e sério, poucos acham que eu sou assim, mas no fundo é a minha essência, um prolongamento do meu ser. Na verdade, a maneira mais sincera que eu consigo me expressar.

Ainda sobre a família, sua esposa, Mayumi, está na área e também seu filho Jun, de 11 anos, tem seguido esses passos. De que forma ele decidiu iniciar na música e como é trabalhada a questão com ele?

Ontem à noite (sábado, 30 de novembro), Mayumi e eu tivemos concerto da Bachiana Sesi Filarmônica, com o João Carlos Martins, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro. Nosso voo atrasou umas duas horas, então Mayumi e eu perdemos a apresentação do Jun no Instituto Fukuda. Ele entendeu, mas deu pra ver a frustração… Isso resume que a música nos une. O Jun adora violoncelo e piano, além de teatro (novamente aqui esta atividade que acho essencial).

Quem foram seus grandes mestres na música erudita, que contribuíram para a sua formação inicial? Na Escola de Música de Piracicaba, o casal Mahle (Ernst e Cidinha), Érico Amaral, Diva de Castro, dona Dirce, Monica Foster, entre outros. O maestro Rizzi, em Piracicaba, foi outra figura marcante na minha formação. Porém, tudo começa dentro de casa. Minha mãe e meu vô Guido, que tocavam piano e violão, respectivamente, sempre tocavam para nós, e vice-versa. O Claudinho era o mais ativo, o moleque era plugado no 220 com música!

A decisão de seguir profissionalmente na área, estudar música em São Paulo e depois o mestrado e o doutorado nos Estados Unidos não devem ter sido fáceis. Descreva essa trajetória.

Quando comecei a faculdade foi um choque. Naquela época, a Escola de Música de Piracicaba nos proporcionava uma formação melhor que as três faculdades estaduais, sem demagogia nenhuma digo isso. Na primeira fase de minha formação, a EMP (hoje Empem) foi a de maior relevância. Depois, um pouco antes de ir para a Unicamp e concomitante ao meu curso de graduação, comecei a frequentar a Escola Fukuda, que realmente me impulsionou, passei a ter aula com o Ricardo Fukuda, na época ele tinha uns 25 anos e já era concertino do Teatro Municipal de São Paulo, ele me ajudou muito. Quando me formei, continuei meus trabalhos com Fukuda e depois de tocar na Orquestra Experimental de Repertório com o maestro Jamil Maluf (olha aí, mais um piracicabano!) e na Jazz Sinfônica, fiz concurso a posto de primeiro violoncelo na Orquestra de Câmera da Unesp, que acabara de ser formada. Foi meu emprego até ir para Chicago, fazer mestrado. Voltei depois de dois anos e assumi o posto de concertino no Teatro Municipal de São Paulo, de onde saí para fazer doutorado na Universidade de Indiana que, modéstia à parte, é talvez a maior escola de música do mundo.

E a rotina no exterior, como foi?

Não foi nada fácil. Em Chicago, Mayumi e eu moramos num estúdio, uma quitinete. O dinheiro mal dava para o aluguel. Ela fazia baby-sitter para os filhos do Alez Klein, então oboísta da Chicago Symphony. Nunca comíamos fora, só o necessário. Muitas vezes, enchemos a barriga com amostras de supermercado. Lembro-me de quando ela estava grávida do Jun: “Vamos dar mais uma volta (no supermercado), ainda estou com fome…”, ela disse. Hoje é engraçado, mas era desesperador. Mesmo em Indiana, não foi fácil, mobilhamos o apartamento com móveis do lixo, claro que era um lixo diferente, mas muitos orgulhosos se recusavam, nós não! E sabe todas aquelas filas de mendigos americanos que se vê em filmes? Para pegar sopa ou comida que os supermercados não venderiam mais? Então, entramos em todas elas, sem pudor e com muito orgulho eu digo que passamos por tudo isso, pois acreditamos no que precisávamos, no que estávamos ali para fazer.

Depois de ter iniciado o curso na Unicamp, abandonou a graduação em música para tentar a medicina. O que motivou essa mudança?

Eu desisti algumas vezes, cheguei a deixar a faculdade de música em 1995 para fazer medicina, mas no final era impossível naquele ponto de minha vida a ruptura com a arte. Francamente, depois de ter estudado na Escola de Música de Piracicaba daquela época, ter feito os festivais de música que havia feito, não dava. Eu não gostava do nível, apesar de meu professor de violoncelo na Unicamp, o Antonio Lauro Del Claro (que é um dos maiores violoncelistas brasileiros de sempre), ser uma figura marcante na minha formação. Na verdade fui pra lá por ele ser o professor de violoncelo da Unicamp, só isso. Só terminei por conta da mesma coisa. Então, eu pensei em fazer medicina muito mais por desespero de cursar uma faculdade, não por vocação. Mas teria, sim, vontade de ter mais uma vida pra ser médico.

Desde quando você reside em São Paulo? O que pesou para que saísse de Piracicaba?

Tudo o que faço é em São Paulo ou saio daqui com a orquestra (de ônibus ou avião). Distância e pegar a estrada constantemente foram os fatores. Adoro Piracicaba, já pensamos “n” vezes em voltar, mas racionalmente é inviável. Eu ficava mais tempo no carro, do que vivia.

A última fila de violoncelistas é composta pelo filho Jun, por André e pela esposa Mayumi. Crédito: Rodrigo Alves

Como é sua rotina de trabalho hoje? Participa de quais orquestras e dá aulas em quais institutos?

Sou violoncelista na Orquestra Filarmônica Sesi-SP, regida pelo maestro e pianista João Carlos Martins; professor de violoncelo na Escola Municipal de Música de São Paulo; no Instituto Baccarelli, e em duas faculdades: Mozarteum e Cantareira. Também sou coordenador pedagógico e professor no Instituto Fukuda, onde trabalho com meu ex-professor, o Ricardo Fukuda, além de tocar muitos solos com diversas orquestras pelo Brasil e de manter um trio com Véronique Mathieu (Canadá-EUA) e Jasmin Arakawa (Japão-EUA). Desde 2010 tenho feito a coordenação pedagógica do Feimep (Festival Internacional de Música Erudita), além de ter assumido a Orquestra Sinfônica de Piracicaba. Ou seja: 24 horas por dia sete dias por semana!

Como é o trabalho na coordenação artística e pedagógica do Feimep, que além da formação de público também se preocupa com os estudantes?

Sem demagogia, é uma proposta incrível a democratização da música erudita. O que foi conseguido nestas três edições é muito mais do que imaginam. O Feimep já é copiado, já é referência e incomoda aqueles que querem manter a elitização da cultura e educação. Novamente graças ao esforço da secretária da Ação Cultural, Rosângela Camolesi, e do diretor do Jornal de Piracicaba, Marcelo Batuíra. O corpo docente se doa, vem muito mais pelos laços de amizade que tenho com eles. Acabei de falar com um dos maiores violoncelistas do mundo, o russo radicado nos EUA, Dimitry Kouzov, professor na Universidade de Illinois, que quer ajeitar a agenda para vir ao Feimepi no próximo ano.

Em julho, durante o Feimep, você assumiu oficialmente a regência da Orquestra Sinfônica de Piracicaba (OSP). É uma nova área que começa a explorar em sua trajetória artística. Quais são os desafios?

Meu desafio é de transformar a OSP em um corpo estável, que possa contribuir para a produção cultural brasileira e disseminar o nome de Piracicaba cada vez mais, não só como celeiro formador de músicos, porém, como mantenedora e produtora de música erudita de alto nível por todos os cantos.

Pela vivência que possui em outros países, você acha que faltam incentivos para a valorização da música clássica no Brasil? O que poderia ser feito para contribuir com o processo pedagógico?

É triste ouvir que um projeto pedagógico acabou por falta de verba, triste! Música, que tornou-se um produto para projetos sociais de fachada, é algo sério, formador de caráter e personalidade. Pela proximidade com a retórica, coloca o ser humano a questionar. No Quadrivium, lá estava ela, acima da própria retórica, que fazia parte do Trivium, na antiguidade grega era parte da mesma matéria, não havia distinção entre matemática, música e filosofia, não que se confundisse, elas eram o mesmo tronco. Hoje, com a indústria do entretenimento, ela é mero instrumento de diversão e lazer… Música séria é uma atividade essencial e que sem a qual a sociedade padecerá.

Em cidades menores, como Rio das Pedras, o que pode ser feito para estimular o surgimento de mais talentos artísticos, em especial a música?

Que se cultive o estudo, mas há que se dar o acesso a concertos e, mais do que isso, não subestimar a criança. Por conta de nós não entendermos algo, achamos que elas não compreenderão, falso pensamento. Minha experiência de dar aulas dentro de uma comunidade em São Paulo, no Instituto Baccarelli, que tem sua sede na comunidade de Heliópolis, mostra que dando acesso à informação, formação e frequentar concertos, transforma- se uma sociedade. Muitos dos alunos são premiados em concursos pelo Brasil afora e temos uma das melhores orquestras jovens da América Latina. Alguns ex-alunos moram e estudam em grandes centros mundiais como Israel, Estados Unidos, Alemanha. Não que esses alunos sejam provenientes desta comunidade carente, porém, a ação deste instituto fez com que jovens do Brasil inteiro se transferissem para São Paulo, para uma comunidade carente, para estudar música! É o caminho inverso… Novamente, que o estandarte do Feimep fique claro: “que se faça a democratização da música erudita, pois erudição e elitismo são contradições em termos!”

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